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Bom Filho

Bom Filho

15 de Abril, 2021

A importância de ter água potável

45.º episódio de «Perspectivas em saúde», na Sinal TV [visitar]

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Ou leia o texto:

Olá!

No último episódio [visitar], terminei com uma referência, ainda que de passagem e a título de exemplo, à associação estatística entre acesso a saneamento básico e esperança de vida em cada país. Esta associação é um reflexo da importância de ter água potável para beber, cozinhar e realizar as demais actividades humanas que dependem da água, incluindo o lazer.

É por isso que uma das funções essenciais da saúde pública é vigiar a qualidade da água para consumo humano — a água que bebemos, portanto, e outras águas com que contactamos: na piscina, na praia, nas termas, etc.

A propósito da vigilância da qualidade da água para consumo humano, quero relembrar uma curta cena do filme «Regresso ao futuro III» [visitar], em que a personagem principal, o Marty, viaja no tempo, até ao século XIX, a fim de resgatar o seu amigo Doc Brown, que está em vias de ser morto por um pistoleiro fora-da-lei, por uma questão de oitenta dólares. Os três filmes desta trilogia são bem dispostos e oferecem uma tarde ou um serão bem passados, longe de preocupações mundanas ou metafísicas, tendo uma legião de fãs espalhada pelo mundo, pelo que recomendo o seu visionamento, a quem nunca o tenha feito antes, ou mesmo a quem já o tenha feito, mas agora olhando pelos olhos dum médico de saúde pública.

Então, a cena a que me refiro passa-se logo à chegada do Marty ao século XIX. Por obra daquelas coincidências que só acontecem na ficção, a primeira pessoa com quem o viajante no tempo se depara é o seu trisavô Seamus, que lhe dá abrigo, roupa e uma refeição. Ora, durante a refeição, a trisavó do Marty, Maggie, pergunta-lhe se ele quer beber água, o que o Marty aceita de bom grado. A sua trisavó verte-lhe, então, um pouco de água dum jarro para o copo, mas o Marty, ao olhar para a cor da água que lhe puseram no copo, muda de ideias e opta por jantar «a seco» (não que lhe corra muito bem, pois logo de seguida quase parte os dentes num pedaço de chumbo do cartucho que matou o coelho, o que nos poderia levar a falar de questões de segurança alimentar, que é outro ramo da saúde pública, mas deixemos isso para outras núpcias). Voltando ao filme, eu não censuro o Marty por não querer beber a água: é que a que a trisavó Maggie lhe oferece é amarela e tem pequenas partículas suspensas, a flutuar…

Trouxe esta cena do filme «Regresso ao futuro III» a lume, porque ela ilustra, ainda que talvez não fosse essa a intenção do realizador, o grande caminho que percorremos desde essa altura até aos nossos dias, em termos de qualidade da água para consumo humano.

Dizia eu que, no último episódio [visitar], falei sobre a importância do saneamento básico. Esse foi um dos grandes progressos da humanidade, em termos da qualidade da água, ao permitir separar as águas residuais daquela que se usa para beber; e isso permitiu cortar o ciclo de contaminação cruzada, que provocava doenças epidémicas, como, por exemplo, a cólera. Não foi por acaso que, há uns anos, ao terramoto que houve no Haiti se seguiu um surto de cólera: com a destruição das infraestruturas básicas (já de si periclitantes, mesmo antes do terramoto, diga-se de passagem), com a destruição do pouco que havia, a separação entre águas residuais e para consumo deixou de existir e o ciclo de contaminação e contágio da cólera pôde instalar-se.

Mas, além do saneamento, outro grande passo foi o fornecimento de água canalizada, através da rede pública. Tendo sido transportada inicialmente através de aquedutos e distribuída pelos fontanários, hoje em dia, a água chega directamente até às nossas torneiras. Além da comodidade, esta água é tratada e, ao contrário das águas dos poços ou dos furos, tem a garantia de estar livre de micróbios capazes de provocar doenças, que podem ser graves e até mortais. É por isso que é recomendável o consumo de água da rede pública em todos os locais, em detrimento das captações próprias, as quais devem ser analisadas periodicamente, para garantir a sua qualidade.

A grande diferença entre o tempo dos trisavós do Marty e a actualidade, que a cena do «Regresso ao futuro III» ilustra, é que hoje dispomos de água tratada, evitando o recurso a poços e a fontanários, que, não estando sob vigilância, oferecem riscos no seu consumo. A agravar a situação, comparativamente ao século XIX, temos hoje maior pressão sobre os aquíferos, pressão essa proveniente da agricultura intensiva, da indústria e da maior quantidade de águas residuais que se produzem (nem sempre tratadas adequadamente). Hoje em dia, temos a certeza de que o adágio «água é vida» é verdadeiro todos os dias, desde que tomemos as atitudes correctas na sua utilização.

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